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11.6.09

Da Felicidade

Quantas vezes a gente, em busca de aventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura,
Tendo-os na ponta do nariz!

Mario Quintana

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Ah, essa vida...

12.2.09

[]

Porque a única resposta que vale a pena é esta. E esta é a minha escolha na vida. 

Bom, quem ousar discutir a minha escolha, sugiro arrancar a calça pela cabeça e, além disso, o "x" ali à direita é serventia da casa, como me lembrou muito bem a Chu.

9.2.09

Bonheur

É uma outra felicidade, essa que tem no desejo a sua condição. Trata-se de uma felicidade que se faz possível uma vez que o sujeito tenha podido não tê-la. Uma vez que ele tenha podido dar lugar àquilo que falta, àquilo que escapa a toda e qualquer aspiração de unidade, de mestria, e de domínio de si. Nesta outra felicidade, o bom encontro (a bonheur) não é mais aquele que A CADA VEZ não se dá no encontro marcado com o Outro. É um bom encontro que se dá, quando não se espera. Como no chiste, essa outra felicidade “designa, e sempre de lado, aquilo que só é visto quando se olha para outro lugar” (Lacan, 1957/58a, p.29). É a felicidade que se acha, quando se procura por outra coisa. É a felicidade que se esvai, que não se fixa, que é apenas encontro. Um bom encontro.
(O sujeito freudiano em busca de felicidade, dissertação de mestrado de Amanda Pilão)
___________________

Obrigada, Amandita.

Obrigada pela defesa mais bonita que já fui, obrigada por permitir que eu participasse da sua travessia. Que bom encontro esse nosso! 

Foi por sua causa, amiga querida, meu mais recente "sim" à psicanálise. 

Parabéns!


2.2.09

Post it



Postando novamente pra (me) dar uma sacudida.

16.11.08

Traduzir-se

Ferreira Gullar
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?

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Achei um monte de horas no site dele.

15.11.08

Porque hoje é sábado

Dia da criação

Vinicius de Moraes



I

Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na Cruz para nos salvar.

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.

Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.

II

Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado.
Há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado.
Há um homem rico que se mata
Porque hoje é sábado.
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado.
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado.
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado.
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado.
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado.
Há um grande espírito de porco
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado.
Há criancinhas que não comem
Porque hoje é sábado.
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado.
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado.
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado.
Há um tensão inusitada
Porque hoje é sábado.
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado.
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado.
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado.
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado.
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado.
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado.
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado.
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado.
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado.
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado.
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado.
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado.
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado.
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado.
Há a comemoração fantástica
Porque hoje é sábado.
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado.
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado.
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado.

III

Por todas essas razões deverias ter sido riscado do Livro das Origens, ó Sexto Dia da Criação.
De fato, depois da Ouverture do Fiat e da divisão de luzes e trevas
E depois, da separação das águas, e depois, da fecundação da terra
E depois, da gênese dos peixes e das aves e dos animais da terra
Melhor fora que o Senhor das Esferas tivesse descansado.
Na verdade, o homem não era necessário
Nem tu, mulher, ser vegetal dona do abismo, que queres como as plantas, imovelmente e nunca saciada
Tu que carregas no meio de ti o vórtice supremo da paixão.
Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas em queda invisível na terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre a renda e missa de sétimo dia,
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e sim no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.

7.11.08

mood


Discover Nina Simone!



They say everything can be replaced
They say every distance is not near
So I remember every face
Of every man who put me here

I see my light come shining
From the west down to the east
Any day now any day now
I shall be released

They say every man needs protection
They say every man must fall
so I swear I see my reflection
Somewhere inside these walls

I see my light come shining
From the west unto the east
Any day now any day now
I shall be released

yonder stands a man in this lonely crowd
man who swears he's not to blame
ALl day long I hear him hollering so loud
just crying out that he's not to blame

I see my light come shining
From the west down to the east
Any day now any day now
I shall be relased

30.10.08

Restos do Carnaval

Clarice Lispector.

Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o outro ano. E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.

No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.

E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.

Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça - eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.

Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com os quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.

Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga - talvez atendendo a meu mudo apelo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel - resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.

Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada: minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo, embaixo da fantasia usaríamos combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse pelo menos estaríamos de algum modo vestidas – à idéia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de vergonha - mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quando ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.

Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.

Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto essa não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge - minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa - mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil - fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros me espantava.

Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido, sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.

Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos já lisos de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.

in "Felicidade Clandestina" - Ed. Rocco - Rio de Janeiro, 1998

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Tropecei em mim umas setecentas e quarenta e duas vezes neste texto.

26.10.08

Se alguém perguntar por mim diz que fui por aí

Coisas bem legais que eu li por estes dias.


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Trecho provisório da dissertação de mestrado da manha amiga de fé e irmã camarada Amanda Pilão.

“É nesse ponto que voltamos a tocar no trecho que acima tomamos de Lacan (1959/60): é na medida mesmo em que busca a felicidade, que cabe a cada homem rebelar-se. Trata-se de uma rebelião – insurreição de cada homem – que não é sem o princípio do prazer: é no próprio campo do princípio do prazer que pode insurgir a subversão, uma vez que a este princípio se opõe o princípio de realidade . Dessa subversão – que a cada vez que se faz, se esvaece – opera-se uma inversão pontual, onde o gozo deixa de ser o alvo, para ser o preço que se paga por desejar. É na medida em que se rebela que o homem pode, ou não, encontrar no desejo o seu “modo específico de ser salvo” (FREUD, 1930, p.91).


(parêntese: e conhecer este seu modo de ser salvo não te deixa alegrinho, não. Já tô ligada no meu e, na boa, dói abrir mão de uma cacetada de coisas. Mas simbora.)

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Do Pedro

Penso que eu amo mais a ti do que tu a mim. E meu coração murcha. De tanto amor e tanta ausência. De tanta presença e tanta dor. Meu coração é uma estrela, que explode para que a lua a veja, dentre tantas outras estrelas que explodiram e tantos outros planetas que gravitam na imensidão negra do universo. Em meus olhos explode toda uma constelação quando vejo teu sorriso. Busco a lua em teus olhos e não a vejo. Algumas estrelas explodem simplesmente para depois morrer.


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"S" na entrevista publicada no kit básico, dia 9/10/2008.

"Às vezes, a gente não se dá conta, mas fala sem querer uma quase verdade ou uma quase mentira".

(eu só diria que toda vez que abrimos a boca!)

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Jose Saramago, em seu caderno.

Perguntava-nos o mestre, e também a si mesmo, como se explica que tenha aparecido tão rapidamente o dinheiro para resgatar os bancos e, sem necessidade de qualificativos, se esse dinheiro teria aparecido com a mesma rapidez se tivesse sido solicitado para acudir a uma emergência em África, ou para combater a sida… Não era necessário esperar muito para intuir a resposta. À economia, sim, podemos salvá-la, mas não ao ser humano, esse que deveria ter a prioridade absoluta, fosse quem fosse, estivesse onde estivesse. José Luis Sampedro é um grande humanista, um exemplo de lucidez. O mundo, ao contrário do que às vezes se diz, não está deserto de gente merecedora, como ele, de que lhe dêmos o melhor da nossa atenção. E façamos o que ele nos diz: intervir, intervir, intervir.


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NO blog do Ancelmo

A morte dos partidos

Trecho do artigo de hoje de Jânio de Freitas na " Folha" :

A maior peculiaridade destas eleições (supondo que haja outras) é uma contradição: baseada, como impõem as regras em vigor, na divisão do corpo político em partidos, as eleições formalizaram o atestado de óbito da identidade destes partidos. Os quais, por definição, só podem ter sentido em razão da sua identidade.
Importa pouco, ou nada, se as identidades partidárias já estavam todas extintas, e as eleições vieram a demonstrá-lo com clareza inequívoca, ou se sobreviviam em coma, em morte cerebral, e agora se extinguiram. A realidade é que os partidos não existem. E, sem a reforma política que crie um novo conjunto de partidos com identidades ofertadas à orientação do país, o que se chamará de política serão apenas transações e aventuras de todo tipo. Com a pior índole e nenhum compromisso senão com vantagens.

[ainda em tempo: sábado passado eu quase briguei (é, isso mesmo) na rua com uns cabos eleitorais do PCdoB que estão apoiando o Eduardo Paes. Pra mim, isso é a trombeta do Apocalipse]

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E pra finalizar engraçadinha. Do blog do Adão. (das duas, uma: ou clica na imagem para vê-la decentemente ou vá ao blog do Adão! :D)





(grifos meus. todinhos!)

17.10.08

Para minha menina com uma flor

antes

Porque você é uma menina com uma flor, eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velha: mas só quando eu der uma paradinha marota para olhar para trás, aí você pode até rir da sua véia de guerra aqui, eu compreendo.

Porque você é uma menina com uma flor e tem esta voz doce desde bem pequeninha, eu juro, eu juro, eu juro nunca mais me afastar de você. Porque eu acredito que nenhuma geografia é capaz de afrouxar laços de amor e essa nossa geografia nem é tão geografiiiiiiiiiia assim. E agora que o nosso está bem apertadinho, eu não te largo mais. Salvo se você engrossar a voz e ficar com uma que nem da Ângela Rorô... Porque aí também já é demais para todos os meus parafusos a menos.

Porque você é uma menina com uma flor e tem esta pele bem branquinha e este cabelo bem escuro e parece uma bonequinha russa que te dá esta sua aura de fragilidade mas você nem é frágil que eu bem sei.

E porque você é minha menina com uma flor e tira fotos lindas, que me deixam aqui de boca aberta com o teu talento. Mas acaba que eu fico de boca aberta com teu talento para a escrita e com seu gosto musical, que é ótimo, mas ainda assim você dá ouvidos aos meus pitacos musicais. E olha que deve ter coisa bem chata naquele cd que te gravei. E você tem uma tia bem babona. Todos agora sabem.

Porque você é uma menina com uma flor e está em plena adolescência, mas é sempre tão segura, tão íntegra, tão doce, tão tranqüila, tão cheia de dignidade de si que nem parece adolescente e me faz ter um orgulho dos diabos de ser sua tia.

Porque você é uma menina com uma flor e vai pra Campos do Jordão ano que vem e eu fico aqui que nem uma boba torcendo, torcendo, torcendo, tanto quanto aquela outra pessoa lá, para que algo role antes do ano que vem chegar. E aquela pessoa lá tá certa em torcer. Porque é bom demais saber que adolescência pode ser que nem de conto de fadas, com direito a beijo de príncipe e tudo.

Porque você é uma menina com uma flor e eu presenciei sua primeira associação livre. Você devia ter uns três aninhos de idade, segurou o rosto da minha melhor amiga com uma mãozinha de cada lado e falou olhando bem no fundo do olho dela: “linda... bonita... banho”.

Mas todas estas coisas que te escrevi são pra deixar claro que eu fico tão orgulhosa de estar na sua vida e de estar mais próxima e de poder te dar conselhos que hoje, eu sei, você acha completamente disparatados, mas tudo bem, um dia você vai entender. Todos eles. E não, não vai ser tarde, porque neste mesmo momento você vai perceber que a vida tão tão tão cheia de possibilidades que ai, só de pensar meu coração se enche de cores.

Mentira. Te escrevo porque hoje é seu aniversário e porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor.


agora!

Te amo.
Feliz aniversário.
E se jogaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!



(livremente inspirando em "Para uma menina com uma flor", do Vinicius de Moraes)

13.10.08

O desepero da piedade

(...)
Vinicius de Moraes

E no longo capítulo das mulheres, Senhor, tende píedade das mulheres
Castigai minha alma, mas tende piedade das mulheres
Enlouquecei meu espírito, mas tende piedade das mulheres
Ulcerai minha carne, mas tende piedade das mulheres!

Tende piedade da moça feia que serve na vida
De casa, comida e roupa lavada da moça bonita
Mas tende mais piedade ainda da moça bonita
Que o homem molesta – que o homem não presta, não presta, meu Deus!

Tende piedade das moças pequenas das ruas transversais
Que de apoio na vida só têm Santa Janela da Consolação
E sonham exaltadas nos quartos humildes
Os olhos perdidos e o seio na mão.

Tende piedade da mulher no primeiro coito
Onde se cria a primeira alegria da Criação
E onde se consuma a tragédia dos anjos
E onde a morte encontra a vida em desintegração.

Tende piedade da mulher no instante do parto
Onde ela é como a água explodindo em convulsão
Onde ela é como a terra vomitando cólera
Onde ela é como a lua parindo desilusão.

Tende piedade das mulheres chamadas desquitadas
Porque nelas se refaz misteriosamente a virgindade
Mas tende piedade também das mulheres casadas
Que se sacrificam e se simplificam a troco de nada.

Tende piedade, Senhor, das mulheres chamadas vagabundas
Que são desgraçadas e são exploradas e são infecundas
Mas que vendem barato muito instante de esquecimento
E em paga o homem mata com a navalha, com o fogo, com o veneno.

Tende piedade, Senhor, das primeiras namoradas
De corpo hermético e coração patético
Que saem à rua felizes mas que sempre entram desgraçada
Que se crêem vestidas mas que em verdade vivem nuas.

Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres
Que ninguém mais merece tanto amor e amizade
Que ninguém mais deseja tanto poesia e sinceridade
Que ninguém mais precisa tanto de alegria e serenidade.

Tende infinita piedade delas, Senhor, que são puras
Que são crianças e são trágicas e são belas
Que caminham ao sopro dos ventos e que pecam
E que têm a única emoção da vida nelas.

Tende piedade delas, Senhor, que uma me disse
Ter piedade de si mesma e de sua louca mocidade
E outra, à simples emoção do amor piedoso
Delirava e se desfazia em gozos de amor de carne.

Tende piedade delas, Senhor, que dentro delas
A vida fere mais fundo e mais fecundo
E o sexo está nelas, e o mundo está nelas
E a loucura reside nesse mundo.

Tende piedade, Senhor, das santas mulheres
Dos meninos velhos, dos homens humilhados – sede enfim
Piedoso com todos, que tudo merece piedade
E se piedade vos sobrar, Senhor, tende piedade de mim!


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(Eu sei. É enorme, ninguém gosta de ler textos grandes em blogs... Mas eu amo este tal de Vinicius de Moraes, o homem plural - porque se ele fosse singular, seria Viniciu de Moral - e antes que voces achem que minha piada é péssima, ela não é minha. É daquele senhor que eu também amo, aquele Antônio Carlos Jobim. E vamo combinar, este texto é lindo!)

2.10.08

Da série: é por isso que eu amo Freud (parte II)

"Quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir fica convencido de que os mortais não conseguem guardar nenhum segredo. Aqueles cujos lábios calam denunciam-se com as pontas dos dedos; a denúncia lhes sai por todos os poros."

(Freud, 1905, v. VII)

1.10.08

Da série: é por isso que eu amo Freud.

"O homem não deve querer exterminar seus complexos, mas entrar em acordo com eles - eles são os dirigentes legítimos de seu comportamento no mundo."

(Trechindo da carta a Ferenczi, em 17.11.1911)

30.9.08

Da série: é por isso que eu amo Shakespeare

"Por que sempre teu rosto com estas nuvens?"

"Ser ou não ser... É esta a questão. Que é mais nobre para a alma: suportar os dardos e arremessos do fado sempre adverso, ou armar-se contra um mar de desventuras e dar-lhes fim tentando resistir-lhes? Morrer... dormir... mais nada...Imaginar que um sono põe remate aos sofrimentos do coração e aos golpes infinitos que constituem a natural herança da carne, é solução para almejar-se. Morrer... dormir... dormir... Talvez sonhar... É aí que bate o ponto. O não sabermos que sonhos poderá trazer o sono da morte, quando ao fim desenrolarmos toda a meada mortal, nos põe em suspensos. É essa idéia que torna verdadeira calamidade a vida assim tão longa! Pois quem suportaria o escárnio e os golpes do mundo, as injustiças dos mais fortes, os maus-tratos dos tolos, a agonia do amor não retribuído, as leis amorosas, a implicância dos chefes e o desprezo da inépcia contra o mérito paciente, se estivesse em suas mãos obter o sossego com um punhal? Que fardos levaria nesta vida cansada, a suar, gemendo, se não por temer algo após a morte - terra desconhecida de cujo âmbito jamais ninguém voltou - que nos inibe a vontade, fazendo que aceitemos os males conhecidos, sem buscarmos refúgio noutros males ignorados? De todos faz covardes e empresas momentosas se desviam da meta diante dessas reflexões, e até o nome de ação perdem (...)"

"O medo é amparo certo".

Da tradução do domínio público. Clique para download!